A escola deve ser um lugar para todos

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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL

No caso da formação de conceitos, a visão tem um papel evidentemente integrador. Por exemplo, a formação do conceito de cão dependerá da apreensão de diferentes estímulos, sensações tácteis, auditivas, olfactivas e visuais, que geram informações que, através da visão, serão integradas, estabelecendo, assim, o conceito propriamente dito.
Por exemplo, a criança normal toca a cabeça, o corpo, as pernas do cão, ouve seus latidos e, ao mesmo tempo, vê a imagem do cão todo.
Na criança com DV, isso será feito, de forma alternativa, por adultos que, ao conversar com a criança, apontam para os aspectos relevantes dos objetos e a partir desses aspectos será formado o conceito.
De um modo geral, em relação ao desenvolvimento do pensamento é necessário oferecer à criança DV, sistematicamente e de forma planejada, experiências que a criança normal tem, de modo assistemático e não planejado, quando ela interage em um ambiente rico em experiências (Enumo et al., 1999).
De acordo com Recchia (1997a,b) mesmo a construção da intersubjetividade, que tem origem nas experiências sociais compartilhadas, necessitará de certas adaptações. Dessa forma, essas adaptações são necessárias, tanto por parte da criança DV quanto por parte do adulto em
interacção com ela, uma vez que os padrões de comportamentos verbais e não verbais não podem ser ensinados incidentalmente.

Dificuldade de aprendizagem e a criança DV

De acordo com Layton e Lock (2001), quando ocorrem falhas no desempenho da criança deve ser investigada a origem desse mau desempenho e considerada a possibilidade da ocorrência de um processo problemático interno como indicativo de uma dificuldade de aprendizagem (DA). Pelo fato das dificuldades académicas de crianças com DV poderem não ser atribuídas imediatamente a uma dificuldade de aprendizagem, para aqueles autores as DAs dessa criança são geralmente negligenciadas por diversas razões:

a) enquanto que a DV é diagnosticada precocemente, a DAs se tornam aparentes somente nos níveis elementares de ensino;
b) a DA da criança DV é por vezes confundida com o baixo funcionamento visual;
c) a incapacidade visual é mais facilmente observada do que a DA;
d) padrões de aprendizagem atípicos podem ser facilmente negligenciados;
e) a natureza fisiológica da DV pode ser mais prontamente aceita do que o rótulo obscuro da DA, que é mais aceitável para os níveis escolares mais baixos e pode ser explicado por uma falha escolar.

Para tanto, um processo de identificação de DA em crianças com DV deve ter o cuidado prévio de verificar, pelo menos, três aspectos:

a) se a criança tem recebido intervenção adequada para compensar seu nível de funcionamento visual;
b) se essa intervenção está de acordo com as necessidades da criança;
c) se tem sido fornecido suporte/orientação (conhecimento, competências e estratégias) para os professores da criança DV.

Além disso, a identificação de DAs na criança DV enfrenta outros problemas, tanto no que se refere a variabilidade da DV em termos de acuidade visual, eficiência visual e estratégias compensatórias entre a população com problemas visuais. No entanto, o maior problema na identificação da DA na criança DV se refere aos instrumentos de diagnóstico que, além de não serem padronizados para a população com DV, são usados através de procedimentos não padronizados, com adaptações e modificações que invalidam seus resultados.

Nesse sentido, Layton e Lock (2001) ressaltam o papel dos dados qualitativos no processo de identificação da DA em crianças com DV, com objetivo de verificar os resultados quantitativos obtidos através dos instrumentos diagnósticos e fornecer informações que contribuam no desenvolvimento de programas de intervenção. Igualmente, deve ser dada atenção ao que Layton e Lock (2001) chamam de desordens para um fim) que são as características definidoras das DAs.
Para esses autores, os indivíduos com DA lidam de maneira diferente com certos tipos de informação e utilizam operações mentais disfuncionais que conduzem diretamente às dificuldades na leitura, escrita e outras áreas académicas.
Os processos intrínsecos de desordens são inerentes ao indivíduo que tem DA e a identificação da DA passa necessariamente pela determinação desses processos, que podem ser identificados por um instrumento chamado The Learning Disabilities Diagnostic Inventory cit. por Layton & Lock, 2001), desenvolvido para auxiliar a identificação desses processos através da observação do comportamento do sujeito em seu próprio contexto educacional.
Ainda com relação ao desenvolvimento cognitivo da criança DV, para Ferrel (1996) a deficiência em si não afeta cognitivamente, mas sim o a criança DV pode apresentar problemas em várias áreas do desenvolvimento cognitivo, incluindo a categorização, a noção de objecto permanente e a
aprendizagem.
A atividade de categorização para a criança DV é mais difícil do que para a criança normal. Nessa última, a aprendizagem de categorias se inicia pela escolha e ordenação de objectos e pessoas pelos seus atributos físicos (forma e cor), para posterior ordenação dos mesmos em termos de grupos, função e associação. Para a criança DV, em função dela não poder alcançar asprocessos intrínsecos de (atos mentais com base fisiológica ou operações que conduzemLDDI –de Hammill e Bryant, 1998), o que a criança é capaz de aprender como a criança irá aprender. Assim, algumas vezes, (A.C. BARROS DA CUNHA & S.R. FIORIM ENUMO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL) semelhanças e diferenças dos objectos do ambiente através do canal visual, a criança deverá aprender a categorizar pela indicação verbal das semelhanças ou pela percepção táctil, onde o outro terá papel importante chamando a atenção
da criança para os atributos principais que diferenciam um objecto do outro.
A noção de permanência de objecto, ou seja, a noção de que algo continua a existir mesmo longe da percepção imediata, é bastante complexa para a criança DV. A criança DV, devido ao facto de não poder depender de sua visão para obter informação sobre o que acontece com as coisas, somente irá perceber que algo ainda existe no ambiente (noção de permanência de objecto) quando ouvi-lo ou tocá-lo. Ainda no que se refere à construção da noção de objecto permanente, existem estudos que afirmam que, na criança DV, a aquisição precoce de palavras produzirá mudanças significativas no desenvolvimento da noção de objecto permanente (Bigelow, 1990).
No que diz respeito à aprendizagem, as crianças DV aprendem a construir suas representações mentais, por uma imagem ou ideia de algo que elas não tenham uma experiência sensorial completa. Contudo, isto não significa que a aprendizagem da criança DV é impossível. A aprendizagem desse tipo de criança deverá ser sistematizada e estruturada, de forma que a criança apreenda a informação completa sobre o conceito a ser aprendido. Hall (1981) complementa afirmando que um dos componentes cognitivos que pode ser observado diferenças na criança cega congénita é a construção de imagens mentais. O desenvolvimento de imagens mentais pela criança cega congénita, quer seja através da experiência directa ou indirecta ou através da explanação verbal, deve ser estimulada, já que as imagens mentais são partes integrantes do desenvolvimento dos processos cognitivos.

Família da criança DV e ambiente escolar

Outro importante factor relacionado à aprendizagem da criança DV se refere ao envolvimento da família no ambiente escolar. Milian (2001) investigou as iniciativas de esforços da escola em envolver a família de crianças DV de origem latina residente nos Estados Unidos e identificou três factores principais que contribuem para aumentar a participação da família na escola:

Com relação aos factores da escola, essa autora descobriu que o facto da escola fornecer informações sobre os progressos académicos da criança e orientações sobre como auxiliar seu filho nas actividades escolares, convidar os pais para reuniões e encontros e contactá-los quando a criança apresenta problemas são alguns dos aspectos relatados que podem contribuir para que as famílias se engajem mais nas actividades escolares da criança DV, até mesmo assumindo responsabilidades na estrutura escolar como voluntários.

No que diz respeito aos factores da criança, a faixa etária da criança é um factor que tem relação com as estratégias adoptadas pela escola para envolver a família (como a escola informa, instrui e contacta os pais) e, por consequência, com a iniciativa da família em participar nas actividades escolares do filho com DV. Quando a criança é mais jovem, a escola apresenta mais iniciativas de
envolver a família, através de visitas domiciliares, informações sobre o que é ensinado em sala de aula e instruções sobre os trabalhos de casa, do que quando a criança é mais velha. Para Milian (2001), tais estratégias deveriam ser adoptadas pela escola ao longo da vida académica da criança com DV, desde o ensino básico até o médio. Igualmente, o facto da criança não saber ler ou ler Braille ou impresso também é um diferencial para o tipo de esforços adoptado pela escola para envolver a família da criança DV. A criança DV que ainda não sabe ler é vista pela escola como necessitando mais reforço em casa, o que aumenta a comunicação entre os pais e a escola, que fornece orientações sobre como os pais devem ajudar a criança nos trabalhos de casa.
Os dados referentes ao último factor (da família) estão directamente
relacionados ao tipo de partici antes da investigação de Milian (2001): famílias de origem latina residentes nos Estados Unidos. O tempo que a família reside no referido país, assim como o idioma (inglês ou espanhol) utilizado por eles foram determinantes para um maior ou menor envolvimento da família na escola, sobretudo nas visitas domiciliares (Milian, 2001).

Impacto na família

No estudo do desenvolvimento da criança com DV, uma das questões que se coloca como extremamente relevante se refere ao processo de interacção mãe-criança e suas possíveis influências no desenvolvimento da criança DV.
Muitos factores podem interferir no relacionamento da família, particularmente no da mãe com o filho DV.
Da mesma forma que a criança com outras NEE, quando a criança DV nasce se produz um choque na família e em especial na mãe, que viverá um período de adaptação e elaboração gradual a esta realidade não esperada durante um longo tempo (Marques, 1995). Assim, a mãe de uma criança que nasce com DV, ou outra deficiência qualquer, experimentam um processo de
luto permanente pela perda do filho idealizado (saudável) e esse luto é actualizado quanto surgem situações críticas, tais como a entrada na escola, a adolescência, entre outros (Amaral, 1995).
E ainda, muitos pais de crianças DV duvidam da sua capacidade em administrar aspectos práticos e emocionais na criação de seus filhos (Bolinger & Bolinger, 1996; Leyser, Heinze, & Kapperman, 1996), sentindo-se impotentes diante de situações da vida diária e intimidados ou inadequados para cuidar de uma criança que não enxerga. Embora esses sentimentos possam ser considerados normais, para Bolinger e Bolinger (1996) tais sentimentos diminuem a percepção dos pais de como manejar as situações de interacção com a criança DV.

Cunha, A.C.B. (2001). Interacção mãe-criança e Avaliação dinâmica de habilidades
cognitivas de crianças com deficiência visual: Um estudo experimental sobre suas relações.
Projeto de exame de qualificação de Doutorado. Programa de Pós-graduação em Psicologia,
UFES, ES. Brasil.

Factores da escola, factores da criança e factores da família

Desenvolvimento cognitivo da criança DV

Com relação ao desenvolvimento cognitivo, Hall (1981) afirma que as diferenças em tarefas de raciocínio observadas em crianças DV se devem a ocorrência de diferentes modos de representação, que, por sua vez, resultam em diferentes habilidades de processamento cognitivo. Durante algum tempo, se considerou que a criança DV teria um atraso cognitivo; no entanto, isso se deve ao facto de que, além dos resultados que suportam essas afirmações serem sustentados por pressupostos do enfoque comparativo, a avaliação cognitiva dessas crianças era feita com testes verbais elaborados para crianças normais.
Uma das principais dificuldades que a criança DV enfrenta no que se refere ao desenvolvimento cognitivo diz respeito à lacuna na apreensão dos estímulos devido a ausência da percepção visual. É sabido que a percepção visual é o principal canal de veiculação e acesso às informações que serão, posteriormente, utilizadas para construção das representações da criança sobre o mundo. Logo, o papel que a visão desempenha como organizador dos eventos e integradora das informações do ambiente para a criança normal, não tem correlato na criança com DV (Recchia, 1977).

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